Curto relato sobre um domingo

Tinha areia nos peitos, um outro punhado na boceta e gosto de mar colado pela pele queimada.
Os sentidos se confundiam e não sabia se era paz ou se era vento o que batia em sua alma. Entre um bocado de pedras sentia como era ser realmente íntima de alguém, sem a necessidade de fingir e fugir do que se é.

Despertou algumas vezes naquele domingo. Transitar entre o sonho e os olhos abertos era bom de igual maneira, mas a irrealidade do dormir a convenceu de que acordar era mais interessante. Diferente de outros contatos, realmente se interessava pelo que tinha com aquele corpo e, quem sabe, com a alma que dormia ao seu lado. Tudo era distribuído de maneira que amaciasse quem o olhava. Não soube se por alegria ou por comoção deixou que uma trilha d'água escorresse por seu rosto. Sorrindo, secou-se e acordou o outro alguém. Beijos sonolentos, toques de mãos ainda adormecidas e a prazerosa sensação de sentir-se quista e de querer bem a alguém, por dentro, por cima. A comida perdia um pouco da graça quando pensava no gosto dos dois, mas comia.
Saíram quase no fim da manhã, com água e alguns sanduíches. A estrada, longa e sinuosa, tinha pouco sol e algumas fotografias foram feitas para que se pudesse provar. Esperava algum raio de sol, mas só os raios do olhar dele já eram suficientes para aquecê-la. Deitaram-se em meio ao vento e algumas folhas aleatórias que eram trazidas.
As ondas, atraentes, tinham o mesmo balançar dos corpos atraídos. As ondas, que outrora quiseram afogar, afagavam. Tiveram um bom domingo, ela com ele, queimando-se no sol do meio dia, embalados pelo sono de muitos dias e pelo vento. A fala deles dançava com os grãos de areia que se quebravam na boca, sorriam.
Tinha areia nos peitos, um outro punhado na boceta e gosto de mar colado pela pele queimada.
Os sentidos se confundiam e não sabia se era paz ou se era vento o que batia em sua alma. Entre um bocado de pedras sentia como era ser realmente íntima de alguém, sem a necessidade de fingir e fugir do que se é.
A estrada rápida estava igual em comprimento, mas parada. Parada de beijos, de carros quebrados, parada em lombadas e em uma aldeia indígena qualquer. Ardiam vermelhos com resto de sol que carregavam. Chegavam, um pouco mais tarde, a um destino que logo deixaria de abrigá-los. Comeram. Por acidente, descuido ou cansaço,  ela desprendeu-se do domingo, das dores, do ardor de uma pele que carregou tanto prazer ao longo de um só dia. Acordou mal, talvez pela proximidade da rotina a ser retomada ou se pelas queimaduras de sol, procurou algum conforto num banho quente. Não ardia a temperatura, mas a presença alheia, não ardia a água em suas costas, mas os lábios que se misturavam aos seus. O domingo estava em seu limite, não podia se prolongar, não podia ceder às vontades dela de ficar mais. Foram embora, levados pelas obrigações.
Segunda feira - Acordou, mas preferiu voltar a dormir. Pois pareciam-se com o domingo, os sonhos.

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