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Mostrando postagens de setembro, 2015

Percepções

Dos três partos, nenhum deixou marca mais profunda que a da entrega. Carrega no rosto linhas acentuadas e no pescoço uma corrente com três pingentes, um para cada filha. Ela tem cheiro de friagem e as costas curvadas pelo peso invisível de uma vida sem ruídos, cheia de gritos. É quase tão esguia como as estrias em suas costas, a mostra por um descuido com o uniforme. Apesar de não esboçar um sorriso, mesmo quando lhe é dito um delicado ‘obrigado’, o olho esquerdo sempre responde, ainda que sem querer, a qualquer interação - o tique nervoso a faz piscar quase que sem parar. A vontade de ajudar está sempre comprometida, não sei ao certo se por preguiça ou pelo peso de tantas pulseiras nos braços. Tem a voz devagar, parece puxada com muito esforço de um lugar de onde não deveria sair. Tenho a impressão de que cedo ou tarde escorrerá entre as catracas e desaparecerá, derretida pelo chão em que piso. O escuro dos cabelos misteriosamente reflete no vazio dos olhos e traz à tona o eco d